segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Final - Último Capítulo Especial

Antes de sair precisei falar com mais alguns parentes. Meus avós por parte de mãe, tia Agatha e tia Emily. Apressei-me para ver meus primos; curiosa.
As duas pestinhas loiras eram meus vizinhos. A porta da casa estava aberta. Subi as escadas direto para o quarto da Priscila, onde encontrei os gêmeos com seus olhos azuis brilhando de ansiedade. Apontaram para um pacote na cama.
- Seu presente. - Falaram quase ao mesmo tempo.
Uma lágrima correu do meu rosto quando vi. Aqueles dois realmente me conheciam. Era um quadro enorme cheio de fotos dos Fallen Angels. Fotos que eu nunca nem tinha visto antes. A coisa mais difícil era conseguir foto da banda com aquele povo. Meus pais quase não tinham e pelo que parecia nem meus tios. Eu me enchia com fotos que pegava na internet de antigos fãs da banda.
- Como... ? - Esboucei.
Eles se entreolharam satisfeitos.
- Demos o nosso jeito.
Encarei cuidadosamente cada foto. Em algumas nossos pais também estavam.
Voltamos para a minha casa. Fiz questão de levar o quadro para o meu quarto, Daniel foi me ajudando, porque o quadro era mais pesado do que parecia.
A sala estava abarrotada. Nicole, a filha da Kate James estava na sala. Sua mãe não pode ir porque estava ocupada com a gravação de mais algum filme. Do lado dela estava a tia Mari e o tio Scott.
Mariana além de minha tia, mesmo que só por consideração, também era minha professora e fazia as melhores refeições do mundo! Seus bolos... Passar as tardes na casa deles era o sonho de qualquer criança; eu adicionaria adolescente, já que eu continuava amando. Eu não via tanto o tio Scott, ele era bastante ocupado com "negócios da família" como todo mundo me dizia quando eu perguntava o que o tio fazia.
Olhei ao redor ansiosa. Já estava anoitecendo e não estavam todos que eu esperava lá.
- Sua mãe me disse que você não queria bolo de aniversário, por isso eu fiz um bolo como presente exclusivo para a aniversariante. O seu preferido! - Tia Mariana falou e piscou um de seus olhos para mim.
- Você costumava gostar de assoprar as velinhas enquanto todos cantavam "parabéns pra você". - O tio comentou.
A tia Mari empurrou três dedos no ombro do tio, repreendendo o seu comentário.
- Vocês não fazem festinhas assim pra vocês. Agora eu tenho quinze anos, tio. Não sou mais uma criança. - Respondi um pouco revoltada por ninguém perceber que eu estava crescendo.
Ele sorriu - Não está mais aqui quem falou.
Sorri de volta e pedi licença. Dei mais uma olhada em todos conversando animadamente na sala e fiquei quase satisfeita. Fui para a parte de trás da casa.
Caminhei até a beirada da piscina e brinquei mexendo na água.
- Uau! - Alguém falou.
Dei um grito bobo com o susto.
- Desculpa, não quis de assustar. Eu já estava para entrar e te dar os parabéns apropriadamente.
Ele sorriu. Um sorriso que eu não via há muito tempo e que fazia meu coração bater mais forte.
- Ethan!
- Gostei do visual. - Apontou para o meu cabelo.
- Obrigada. Nossa, faz tanto tempo que não te vejo... - Falei ainda sem acreditar que ele estava bem ali na minha frente.
- Desculpa por isso também. Não tem sido fácil lá na faculdade.
- Imagino...
Ficamos em silêncio uns segundos.
- E o meu abraço? - Pedi.
Ele sorriu largo e me abraçou. Perguntei mentalmente se além de lindo ele precisava cheirar tão bem. Sentei na cadeira ao seu lado.
- Ainda evitando seus pais? - Perguntei.
- Um pouco. - E me lançou um olhar que eu conhecia.
- O que foi, Ethan?
Sorriu novamente. Por mim, ele podia continuar me mostrando aqueles dentes perfeitos a noite toda. Sem problemas, pensei.
- Você continua perceptiva.
Perceptiva e uns sete malditos anos mais nova que você. Suspirei pesarosa.
- Então, ainda não contei aos meus pais, mas desisti da faculdade de direito. Estou fazendo de artes.
Lembrava de seus desenhos. Tinha guardado um que ele fez de mim.
Abri a boca dramatizando. - Seu pai com certeza vai pirar.
Ethan balançou a cabeça confirmando.
- Mas você está certo, Ethan. A vida sua, você sabe o que é melhor pra você. Uma hora seu pai supera...
Tio Scott era um pai cheio de exigências. Às vezes minha mãe dizia que o tio deveria ser assim por medo que o filho tivesse a mesma vida que ele quando jovem.
- Eu sei... - Olhou-me de lado. - Mas hoje é o SEU dia. Melhor a gente entrar e comemorar com o pessoal.
Ethan se levantava, segurei de leve seu pulso. - Podemos ficar aqui só mais um pouco?
Olhou-me com ternura e sentou-se.
- Você mudou tanto que nem parece mais a criança que se despediu de mim aqui em Primavera há quatro anos. - Comentou.
Sorri satisfeita. - Lembra de nossas conversas até tarde na varanda da sua casa?
- Claro. Eu vivia te enchendo com meus dramas familiares...
Olhou-me novamente, passou um dos braços por cima dos meus ombros e me puxou para mais perto de si. - Senti a sua falta, Cici.
Adorava que ele fosse o único a me chamar daquela forma. Lembro quando mais alguém tentou me chamar assim também e eu ignorei até que desistiu.
- Vai ficar aqui por quanto tempo?
- Não muito. Talvez eu sobreviva por três dias com meus pais.
- Você podia ficar aqui em casa. Seria o presente de aniversário mais lindo!
Ethan riu. - Que presente de mau gosto! Mas se seus pais não se incomodarem, posso sim.
- Jura?
- Claro. - Deu um beijo na minha testa.
Ficamos ali apoiados um no outro à beira da piscina por um bom tempo antes de entrar. Como eu odiava ser ainda tão nova.
A tia Talita já tinha chegado; permanecia lindíssima. Ela e sua namorada me parabenizaram.
- O que acha de cantar um pouco com a sua tia aqui? - Talita me perguntou.
- Sério? Seria perfeito!

"Um pouco" nada. Cantamos a noite inteira. Meu pai e meus tios tocaram. Foi o melhor aniversário da minha vida.

Final - Primeiro Capítulo Especial

Muitos anos depois

CECÍLIA

Tinha me visto no espelho umas mil vezes naquela manhã. Estava me achando o máximo, sem qualquer sombra de modéstia. Tudo culpa de uma foto antiga que encontrei da minha tia Talita em um dos seus shows; ela estava perfeita. Cabelo na altura do ombro na cor azul turquesa. Fiz questão de deixar o meu exatamente igual. Já tinha exibido meu cabelo exótico para o mundo fazia uns dias, mas o motivo de estar especificamente nervosa naquele momento era porque uma porção de familiares que eu não via há algum tempo chegaria a qualquer momento do dia. Meu tão sonhado aniversário de quinze anos tinha chegado.
Eu não quis nenhuma "super festa", não quis nem chamar meus amigos da escola. Fiz questão apenas que nossa família estivesse presente. Uma música ao fundo, todo mundo reunido na sala contando histórias de quando mais jovens.
Falando assim, faz até parecer que nunca vejo meus parentes. A única coisa que dificilmente acontecia era ter todos reunidos, mas eu tinha memórias muito queridas desses raros momentos.
- Ceci, já tem gente lá embaixo te esperando. Não vai descer? - Minha mãe perguntou me encarando da porta aberta do meu quarto.
Pensei que deveria ser verdade o que dizem sobre as pessoas ficarem mais bonitas aos nossos olhos quando gostamos delas. Porque não conseguia lembrar de nenhum momento em que achei a minha mãe menos que deslumbrante.
- Quem já chegou? - Perguntei animada.
Ela sorriu - Desce e descobre.
Dei, possivelmente, a última olhada no espelho e corri até as escadas. Vi meus avôs por parte de pai e um tio solteirão (meio irmão do meu pai).
Eu sabia que podia deixar os outros com ciúmes, mas não quis me conter e abri o maior sorriso de todos pro meu avó Diogo. Foi o primeiro que abracei e me demorei em seu abraço.
- Melhor avô do mundo! - Eu sempre dizia bem baixinho isso em seu ouvido toda vez que nos encontrávamos.
- Diz isso pra todos. - Ele sempre respondia.
De qualquer forma, eu era uma das poucas sortudas a ter cinco avós. Deram-me meus parabéns.
Meu pai já estava na sala e eu podia apostar que ele era o quarentão mais gato do mundo todo.
- Sally está ocupada? - Minha avó Ana perguntou, mais por educação, imaginei. Ela e minha mãe nunca foram muito próximas.
- Sabe como ela fica quando está organizando festas... - Meu pai respondeu.
Revirei os olhos. Nem tinha o que organizar, minha mãe que ficava inventando...
Continuamos conversando sobre bobagens cotidianas até que chegou quase a família inteira de uma só vez.
Tio Rick realmente me assustou. Ele era ultra mega gato em seu tempo de Fallen Angels, e até nas últimas vezes que o vi pessoalmente não estava nada mal. Mas talvez os divórcios e filhos tenham finalmente pesado em sua aparência, porque parecia ter envelhecido de um dia para o outro uns mil anos.
- O tio não ganha abraço da aniversariante baixinha? - Brincou.
Revirei os olhos - Não sou mais baixinha, tio. - Falei enquanto o abraçava.
Riu como se eu tivesse feito alguma piada.
O tio Caio e o tio Vinícius, que também fizeram parte de Fallen Angels, não tinham nada a ver com os dois jovens que eu via em fotos de seus antigos shows. Suspirei pesarosa com o pensamento. Todos eles tinham mudado bastante. Caio estava com a esposa e Vinícius com a namorada.
Logo atrás dos meninos vi a tia Yasmin. Ela estava sempre organizando eventos para arrecadar fundos para ajudar diversas ONGs. Ao seu lado o tio Derick, um escritor bem sucedido. Muitas das histórias que eu sabia sobre meus pais tinha sido através do livro que ele escreveu muitos anos antes do meu nascimento.
Meus pais eram "chatinhos" para contar histórias; contavam o básico do básico. Se eu quisesse saber um pouco mais, corria para o tio Derick. Eu adorava imaginar meus pais quando jovens e a sua história de amor.
Os dois me parabenizaram.
- Ceci, a Priscila e o Daniel pediram que você os encontrassem lá em casa. - Tio Derick falou.
- Esses dois abusados... - Tia Yasmin comentou sem graça.
Sorri. - Já estou acostumada, tia. Vou lá, então.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

22- Capítulo Vinte e Dois

2011

Nos abraçamos. Trocamos um selinho. Sally segurou a minha mão e me olhou por um momento.
"Por favor, se mandem logo de nossas vistas." Talita reclamou.
Sally levantou uma sobrancelha e respondeu. "Seu pedido é uma ordem."
Me arrastou para o seu quarto. Assim que fechou a porta me empurrou contra a parede. Beijou-me e respondi com a mesma urgência.
"Senti tanto a sua falta." Falei.
Ela encostou a sua cabeça na minha, ainda ofegante. "Nunca mais... Sem mais distancia e saudade."
"Nunca mais." Repeti sorrindo.
Fizemos amor e ficamos juntos na cama por todo o resto do dia.

I Miss You - Blink 182
And in the night we'll wish this never ends
We'll wish this never ends
I miss you, miss you
I miss you, miss you
E de noite desejaremos que isso nunca acabe
Desejaremos que isso nunca acabe
Eu sinto sua falta, sinto sua falta
Eu sinto sua falta, sinto sua falta

O estômago de Sally roncou. Levantei-me.
"Pra onde pensa que vai?" Perguntou.
"Você precisa comer."
Sally sorriu maliciosamente. Ri em resposta.
Estávamos sozinho na cozinha. Enquanto eu procurava algo para fazer um sanduíche Sally começou a falar.
"Tento tanta coisa pra te contar, mas olhando pra você não consigo pensar em muita coisa."
E ouvindo Sally me dizendo essas coisas também não ajudava a lembrar o que eu estava fazendo com a bandeja de queijo na mão.
"Na verdade, eu consigo pensar em MUITA coisa, mas tudo é muito mais praticável..."
Larguei o que tinha nas mãos, segurei seu quadril e a coloquei em cima da mesa. Nos beijamos de uma forma que não seria uma boa ideia ter plateia. Seu estômago roncou novamente. Separamos nossas bocas rindo.
"Melhor você me esperar no quarto enquanto preparo nosso lanche." Falei.
Sally fez beicinho. "Se demorar eu volto."
Quando eu cheguei ao quarto encontrei Sally de costas, encarando a janela. No momento em que ela me ouviu entrar, vi sua tentativa falha de secar algumas lágrimas secretamente.
Coloquei a bandeja em cima de uma comoda. Abracei-a.
"O que houve, meu amor?" Perguntei.
"Não sei o que fazer..."
"Sobre o quê?"
Desviou o olhar e sentou-se na cama. "Tem algo importante que não te contei."
Esperei.
"Existe um curso de teatro fantástico, renomado e desde que soube de sua existência fico me imaginando sendo aluna lá. Mas eles não aceitam qualquer um, sabe? Conversei algo com a Cristina e ela de alguma forma conseguiu um teste lá pra mim." Deu uma pausa, mas ainda sem me olhar. "Fiz o teste e por algum milagre passei."
Eu sabia que os poréns estavam por vir e ainda assim, de pé em sua frente, puxei suavemente seu queixo na minha direção. "Isso é ótimo."
Uma lágrima desceu pelo seu rosto. "Jack..." chamou. "Fica em outro país. E não quero ficar longe de você. Ficamos poucos meses distantes e olha só como o nosso relacionamento ficou. Imagina ainda mais longe e por mais tempo."

Don't waste your time on me, you're already
The voice inside my head (I miss you, miss you)
Não perca o seu tempo comigo, você já é
A voz dentro da minha cabeça (eu sinto sua falta, sinto sua falta)

"Sally Carter, estou com você como namorado, amigo, conhecido, o que você quiser, e seja como for a única coisa que vou sempre querer é te ver feliz, e no que eu puder te ajudar a realizar os seus sonhos. Nunca serei um empecilho na sua vida."
Ela sorriu ainda triste. "Você é uma parte essencial para mim. Sinto que tenho sido uma péssima namorada... Como vamos fazer tudo isso funcionar?"
"Primeiro vamos curtir nossas férias juntos. Depois você vai para o seu curso, sem preocupações e realiza o seu sonho."
"Eu nem sei se é isso mesmo que quero pra mim, Jack. Talvez seja só uma ideia besta e passe logo."
Nos olhamos em silêncio por um tempo.
"Vai ficar tudo bem." Falei.
Nossas férias não duraram tanto quanto eu gostaria. Pouco depois do início do ano, Sally foi embora.

(I miss you, miss you)
(eu sinto sua falta, sinto sua falta)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

21- Capítulo Vinte e Um

2011

Eu e Sally estávamos sempre nos falando, na maior parte através do celular. Eu nunca tinha muito o que contar e adorava ouvi-la falando suas novidades.
"Só vou esperar esse casamento para falar com meu pai que quero voltar a morar em Almerim. A cara de falsa dessa mulherzinha!" Desabafou comigo na nossa primeira conversa desde que ela fora morar com o pai.
Eu sentia a falta de Sally, ali em carne e osso na minha frente, deitando sua cabeça em meu colo ou pedindo que eu matasse aula com ela. Mas nossos constantes diálogos não deixavam que eu me sentisse realmente distante. Imaginei que com o passar dos dias ela começaria a falar menos comigo, mas isso não aconteceu. Entre uma atividade e outra já estávamos conversando novamente. Pelo menos foi assim por um tempo.
Em nossa mais recente conversa eu quase podia ver sua expressão constrangida ao falar comigo pelo celular. "Ela... A Cristina na verdade é uma pessoa bem amável. E a sua filha, Agatha, é tão adorável que eu poderia..." Fez uma pausa. "Estou feliz por elas terem entrado na minha vida, Jack."
Não fiquei surpreso, suas reclamações foram sumindo nos dias anteriores.
Surpreso fiquei com um dos e-mails de minha mãe. Ela me convidava para um almoço em família. A parte inesperada foi o motivo: comemorar o retorno do Scott.
Nunca tive interesse em saber o motivo que o fez sair e muito menos teria em saber o que fez ele voltar. O almoço foi como todos os outros naquela casa. O silêncio e depois cada um de volta para seus afazeres. Mas reparei que o Scott estava diferente. Talvez fosse tristeza. Eu não quis prestar muita atenção.

The Show Must Go On (Queen)
Abandoned places
I guess we know the score
On and on
Lugares abandonados
Eu acho que nós sabemos o resultado
De novo e de novo

Tinha imaginado que por todo aquele alvoroço o pai de Sally faria uma grande festa em seu casamento. Acreditei que seria a oportunidade perfeita para rever a Sally. Mas eles apenas se casaram no cartório.
Sally estava se envolvendo em muitas atividades em sua nova escola e bem, eu mesmo que tinha lhe dado esse conselho; não queria que ela ficasse só. Consequentemente, nossas conversas diminuíram depois de pouco mais de um mês sem nos vermos.
"Pensei em ir te visitar depois da última aula na sexta-feira. Daria para passarmos o fim de semana juntos." Falei com Sally na webcam.
Ela pareceu sem graça. "Não falta tanto assim para o fim do ano, Jack."
"Não quer me ver?"
"Estou te vendo agora." Tentou fazer graça.
Suspirei pesaroso.
"Jack..." chamou. "Desculpa, mas tenho estado muito ocupada. E de um jeito bom. O fim de semana é quando posso ficar com a minha família... e durante a semana tem a escola." Sorriu de mau jeito.
"Você está feliz?"
"Estou."

Inside my heart is breaking
My make up may be flaking
But my smile
Still stays on
Por dentro meu coração está se partindo
Minha maquiagem pode estar escorrendo
Mas meu sorriso
Ainda permanece

Não tivemos muito o que conversar depois.
Enquanto isso a banda parecia estar indo pelo caminho certo. Talita dizia que era certeza conseguirmos algum contrato, que só precisávamos terminar logo nosso ensino médio que todos os nossos sonhos se tornariam realidade.
Como era de se imaginar, meus dias se resumiram a incansáveis ensaios.
As férias tinham chegado e iríamos viajar no dia seguinte. Sally combinou de nos encontrar no hotel. Por isso foi impossível não nos surpreendermos quando vimos Sally passando pela porta de casa.
"Prima?" Ricardo incrédulo.
"A maravilhosa em pessoa!" Sally respondeu rindo.
Ele não revirou os olhos, como teria feito há poucos meses, Ricardo abriu um largo sorriso e foi abraçar a prima.
Sua família estava toda na sala, como se soubéssemos que ela iria aparecer.
"Uma pessoa que não fosse desnaturada teria dito que nos encontraria aqui primeiro!" Talita disse depois de abraçá-la.
Eu continuei no sofá. Sentindo o meu coração batendo enlouquecido.
Sally inclinou a cabeça para um lado me procurando, assim que me encontrou sorriu e então quase deixou de sorrir. "Jack? Não ficou feliz em ver?"
Eu estava feliz. Talvez mais aliviado que feliz. "Estava esperando a minha vez."
Riram e ela me chamou com uma mão.

The show must go on, yeah
The show must go on
O show deve continuar, sim
O show deve continuar

domingo, 29 de novembro de 2015

20- Capítulo Vinte

2011

O meu medo era bem diferente do medo de Sally. E ela sabia que eu nunca a abandonaria enquanto ela me quisesse em sua vida. Não queria pensar no meu medo.
Ficamos abraçados na cama por um momento até ela lembrar assustada que precisava se despedir de seus amigos e que o tempo estava acabando.
Enquanto ela se arrumava esperando o pessoal, era inevitável pensar em como as coisas seriam. Não no que queríamos naquele momento, porém algo mais próximo da realidade.
Eu desejava do fundo do meu coração que essa mudança pudesse fazê-la feliz como ela nunca foi. Porque imaginá-la chorando escondida se sentindo solitária me fazia querer impedir que ela fosse.

Wherever Will You Go (The Calling)
So lately been wondering
Who will be there to take my place
When I'm gone, you'll need love
To light the shadows on your face
Ultimamente tenho pensado
Quem estará lá para ocupar meu lugar
Quando eu for, você vai precisar de amor
Para iluminar as sombras em seu rosto

Quando nossos amigos chegaram fizeram a bagunça de sempre. Até conseguiram com que Sally parasse de chorar e ficasse animada.
"Como vou conseguir ficar sem as maluquices de vocês?"
"Não se anime muito que não vai se livrar da gente tão facilmente." Talita disse.
Um dos seguranças apareceu indicando que já estava na hora.
Ela fez uma cara de quem pergunta "Já?".
"Larga de drama, Sally e se manda logo que em breve estaremos reunidos novamente." Mariana resmungou.
"Também vou sentir saudades, feiosa!" Sally devolveu a implicância.
Depois de mais outros milhões de abraços e despedidas o segurança estava claramente impaciente.
Talita virou o rosto da Sally e lhe deu um selinho nada delicado. Sally arregalou os olhos.
"Pra você ter um motivo pra sair correndo logo daqui. De onde veio esse tem mais..." Talita ameaçou rindo.
Ficamos todos em frente da casa vendo enquanto ela caminhava até o carro e quando ela estava quase entrando no veículo voltou correndo olhando fixamente para mim.
O pessoal começou a rir.
"Você tem que ir logo, amor..." Falei enquanto ela vinha.
Abraçou-me forte e com a mesma intensidade me deu um beijo. Depois voltou correndo para o carro. Nossos amigos fazendo piadas com a cena.
Eu sorria, mas não estava feliz.

Run away with my heart
Run away with my hope
Run away with my love
Fuja com meu coração
Fuja com minha esperança
Fuja com meu amor

"E ai, quem topa ir para uma festa logo mais?" Vinícius.
"Vou pro meu quarto" Falei.
"Até parece que vamos deixar!" Talita fez cara de poucos amigos. "Nem pense em ficar nessa de deprê. Vai sair com a gente e pensar nos próximos shows que temos agendado."
"Talvez até dê pra gente tocar nessa festa." Vinícius comentou.
"Melhor ainda!" Talita.
É claro que eu não queria, mas ela não me deixaria em paz enquanto eu não aceitasse e eu não estava com humor para muita conversa.
"Tudo bem, então." Respondi.
Comemoraram.
A festa teria sido uma completa perda de tempo se não tivéssemos tocado.
Talita me viu quando eu tentei ir embora sem ser visto depois de nos apresentarmos.
"Jack!" Talita me chamou e se aproximou. "Obrigada por ter vindo com a gente. Sei que agora vai querer ficar sozinho, mas tenta não fazer isso. Gostamos da sua companhia... Não quero que fique mal."
"Não se preocupe." Disse secamente.
Ela me olhou sem jeito e um tanto triste.
"Ei..." Tentei me desculpar. "Não precisa mesmo se preocupar. Depois você me conta melhor o que tem planejado pra banda. Não vou sumir dos ensaios."
Ela me deu aquele sorriso que damos para alguém especial. O mesmo sorriso que sempre dei para Sally e que diversas vezes ganhei da Talita.
Abracei aquela garota cheia de piercings na minha frente e lhe dei um beijo na testa.
"Se cuida." Falei.
"Você também."
Já no meu quarto me perguntava se eu não deveria ter ido com a Sally. E ser procurado pela polícia/minha mãe ou virar morador de rua; lembrei.

In your heart and your mind
I'll stay with you for all of time
If I could, then I would
Em seu coração, em sua mente,
Eu ficarei com você por todo o tempo
Se eu pudesse, então eu iria

sábado, 28 de novembro de 2015

19- Capítulo Dezenove

2011

Precisei ler mais duas vezes. Martagon era quase outro país pela distância.
"Não..." Pensei em voz alta.

Hurt (Johnny Cash)
I focus on the pain
The only thing that's real
Eu me concentro na dor
A única coisa que é real

"Eu não vou." Sally disse de imediato."Esse e-mail já tem uma semana e eu não tinha visto. Estava evitando o meu pai. Você sabe que vez ou outra faço isso. Mas eu não vou. Ele nem me perguntou se eu queria. Nem se importa com o que isso vai fazer na minha vida."
Desejei concordar. Dizer que poderíamos fugir e eu teria a Sally só para mim. Peguei suas mãos e olhei em seus olhos. As palavras quase saíram.

Full of broken thoughts
I cannot repair
Cheio de pensamentos quebrados
Que eu não posso consertar

"Acho que dá pra passar em casa e pegar um bolsa com algumas roupas. Tenho algum dinheiro." Ela começou a falar, mas parou chorando.
Coloquei sua cabeça no meu ombro. Nós dois sabíamos que ela iria viajar. Não teria fuga, nem tentativa disso.
"Vai ficar tudo bem." Falei.
A maior tristeza de Sally sempre foi ser distante de seu pai. Quando mais nova ela gostava de me contar como imaginava que seria a sua vida se a sua mãe ainda estivesse viva. Como seria chegar em casa e encontrar seus pais conversando qualquer bobagem. Ter horário pra chegar em casa. Levar bronca por alguma irresponsabilidade. E na nossa realidade, que pelo menos ela tivesse seu pai fazendo esse papel.
Estava ali a sua chance, mesmo que bem pequena, de ter isso. E que bem nos traria fugir? Ver tudo o que minha doce Sally poderia realizar em sua vida ser jogado fora? Nunca.
"Logo agora..." Ela disse. "Como vou ficar sem todo mundo? Principalmente sem você. Parece um pesadelo."
"Falta pouco para o final do ano. Poderemos nos ver e... Se você quiser nunca mais ficaremos longe."
Ela tirou a cabeça do meu ombro e olhou fundo nos meus olhos. Acariciou o meu rosto.
"Vou sentir tanta a sua falta..."
Respirei fundo tentando não pensar em mim.
"Presta atenção. Nada nesse mundo poderia me separar pra sempre de você. Vão ser só alguns meses e depois estaremos juntos novamente."
Ela fechou os olhos e depois os abriu já se levantando.
"Melhor eu ligar meu celular então. Meu pai deve estar enlouquecendo. Me ajuda a arrumar umas bolsas?"
"Claro." Peguei sua mão e voltamos para casa.
Sally falou com seu pai. Separou poucas roupas e alguns objetos.
"Ainda tenho três horas." Falou. "Quero chamar o pessoal para poder me despedir e explicar tudo. Mas antes quero passar mais um tempinho só com você."
Sorri. Fui beijado. Fizemos amor. Ainda deitada em meus braços chamou meu nome e então meneou a cabeça.
"O que foi?" Perguntei.
"É só que... Nós nunca fomos lá muito sortudos. E a vida é essa maluquice..." Pausou. "Nunca tinha passado pela minha cabeça qualquer possibilidade de futuro em que você não fizesse parte da minha vida."
Interrompi. "Ei. Mesmo de longe vou continuar cuidando de você."
Ela sorriu.
"E vai ser por pouco tempo, amor. Vai passar rapidinho, vai ver." Completei.
"Só quero que você saiba que eu nunca amei alguém como amo você e o quanto você é especial."
Esboucei falar, mas ela não permitiu.
"Escuta." Continuou. "Não estou dizendo que você é especial porque eu te amo e porque me ama. E eu te conheço, Jack. Sei bem o que pensa de si. Mas quero que agora, sempre que passar pela a sua cabeça que você é menos do que incrível você possa se lembrar desse momento. Do que estou te dizendo."
"Você me dizendo assim parece que não vamos mais nos ver."
Vi as lágrimas escorrendo pelo seu rosto.
"Se por alguma infelicidade..." Fechou os olhos e respirou fundo. "Jack, estou morrendo de medo."

I am still right here
What have I become, my sweetest friend?
Everyone I know goes away
In the end
Eu ainda estou bem aqui
O que me tornei, minha mais doce amiga?
Todos que eu conheço vão embora
No final

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

18- Capítulo Dezoito

2011

Foi numa manhã, naquele momento em que nos prendemos conscientes aos nossos sonhos. Lembrei-me das vezes em que Sally deitava a cabeça em meu colo feliz porque algum rapaz por quem era apaixonada ter lhe dado uma mínima atenção. Como eu os odiava por a tratarem dessa forma, por lhe fazer aceitar tão pouco e acreditar que era tudo o que merecia.
Todas as vezes em que eu quis lhe mostrar como deveria ser, que ela merecia tão mais e que ainda seria pouco.
Acordei feliz. Eu finalmente tinha a chance de fazer a Sally ainda mais feliz.
Eu estava ansioso e não conseguia me lembrar de quando já tinha me sentido daquela forma antes.

Cannonball (Damien Rice)
There's still a little bit of your taste in my mouth
Ainda há um pouco de seu gosto em minha boca

Sally tinha dormido com as amigas numa espécie de festa de pijama.
Ouvi a campainha tocando incansavelmente e decidi me apressar. Não reconheci o homem na porta.
"Pois não?" Perguntei.
"Trabalho para o senhor Carter. Tenho ordens para buscar a senhorita Carter."
Não tive reação por um instante.
"Senhor? A senhorita está?"
"Não... Na verdade não está." Disse sem saber ao certo se era o que devia.
"Sabe onde posso encontrá-la?"
"Aconteceu alguma coisa?"
"Não tenho informações, senhor. Minha ordem é apenas de acompanhar a senhorita Carter em sua viagem."
"Viagem?"
"Senhor...?" Quis saber meu nome.
"Jack Taylor."
"Senhor Taylor, preciso encontrar a senhorita Carter. Só sei que é importante e tenho um horário a cumprir. O senhor poderia me ajudar?"
"Desculpa. Claro que posso."
A verdade é que eu não queria. Para onde a levariam? E por quanto tempo? Mas poderia ser importante para a Sally, então peguei o meu celular.
"Vou tentar falar com ela." Avisei ao segurança.
Uma mensagem da Sally.

Amor, me encontra atrás da Sorveteria Alpínia o mais rápido possível.

Tentei manter a aparência de tranquilidade e fingi ligar.
"Ela não atende." Informei.
"Entendo. Sabe de algum lugar em que ela possa estar?"
"Talvez na escola. Não faço ideia, pra ser sincero."
"Tudo bem. Agradeço a ajuda, senhor Taylor."
Ele foi embora e esperei alguns poucos minutos antes de sair correndo para a soverteria encontrar com a Sally.
Ela estava sentada em um dos bancos, seu rosto vermelho e cheio de lágrimas.

It's still a little hard to say what's going on
Ainda é um pouco difícil de dizer o que está acontecendo

"Amor?" Sentei do lado e encostei nossos rostos numa carícia, como costumávamos fazer.
"Jack..." Ela me olhou desesperada.
"O que está acontecendo? Tinha um segurança do seu pai procurando por você lá na casa dos seus tios."
Ela procurou algo na bolsa e retirou uma folha de papel.
"Imprimi pra você poder ler. É um e-mail do meu pai."

Querida Filha,

Tenho uma ótima notícia. Você vai ganhar um irmãozinho ou irmãzinha, ainda não sabemos. Além de uma irmã de 9 anos e tenho certeza que vai amá-la. 
Sei que vai ser uma grande surpresa pra você, mas acredite que também estou surpreso. Claire é uma mulher fantástica. Nos conhecemos há algum tempo, não te contei nada a respeito por não ter julgado necessário. Mas terá tempo para conhecê-la melhor antes do nosso casamento.
Acho que finalmente poderei descansar de minhas constantes viagens. Martagon não é um lugar tão luxuoso quanto Primavera, mas certamente é encantador.Vai gostar de morar aqui.
Acredito que uma semana seja o suficiente para que você possa se despedir de Almerim. Vou pedir que alguns seguranças busquem você. Depois encaminho outro e-mail avisando o horário.

Ansiosamente, 
Seu pai.


There's still a little bit of your words I long to hear
You step a little closer to me
So close, I can't see what's going on
Ainda há um pouco de suas palavras que eu desejo ouvir
Você se aproxima um pouco de mim
Tão próximo, que eu não consigo ver o que está acontecendo

terça-feira, 21 de julho de 2015

17- Capítulo Dezessete

2011

Seu rosto era de pura aflição. Eu não poderia estar mais feliz. Passamos pela entrada do colégio de mãos dadas. Sally Carter era a minha namorada e estávamos prestes a contar a nossos amigos.
Como havia imaginado, Sally estava envergonhada demais para dizer qualquer coisa. Enquanto nossos amigos tagarelavam sobre uma porção de coisas, ela permanecia muda e sorrindo timidamente. Se a missão de contar ficaria comigo, faria da melhor forma possível.
Puxei suavemente o queixo da Sally, tentei encontrar seus olhos, mas ela desviou. Inclinei-me e a beijei.
Silêncio.
As expressões eram as melhores: espanto, confusão, curiosidade...
"Estamos namorando." Disse.
"Uau"
"Meu Deus"
"Finalmente!"
"Eu sempre achei que vocês dois formariam um lindo casal, mas se tratando da tapada da Sally, imaginei que não viveria para vê-los juntos. Felicidades!" Mariana.
"Como assim finalmente?" Sally fingiu indignação.
"Ah, Lily... O Jack vive com cara de bobo pra você, não sei como nunca reparou." Talita.
"Como ninguém nunca me disse nada?" Sally.
"Em assunto de marido e mulher, ninguém mete a colher." Vinícius respondeu rindo.
"Que amigos mais imprestáveis!" Sally brincou.

***

Já tinham terminado as aulas do dia e estávamos na casa da Sally em Almerim. Depois do nosso primeiro beijo em Primavera ficou difícil desgrudar nossas bocas. E elas estavam bem grudadas naquele momento, assim como nossas mãos no corpo um do outro.
"Tira essa blusa, Jack..." Sally sussurrou no meu ouvido.
Travei.
Ela se afastou um pouco para ver a minha expressão. "Não quer?"
"Não é isso..."
Ela pausou por um momento analisando. Cerrou seus lindos olhos "Jack, isso não é aquela história de querer fazer isso e aquilo especial não, né?"
Culpado.
"Aff! Jack, todo momento que estamos juntos já é perfeito. Não vê isso?"
Encostei nossas testas e acariciei seu rosto. "Sempre foi pra mim..."
Sally fechou seus olhos sorrindo. "Eu te amo tanto e..."
"E o quê?"
"E... não ri, mas estou muito apaixonada por você. Muito mesmo." Abriu seus olhos com um sorriso ainda maior. "Estou perdidamente apaixonada por você, Jack Taylor."

All of Me (Buckcherry)
All of me please take all of me 'cause you are all I see
Everything to me
Tudo de mim, por favor tenha tudo de mim, porque você é tudo que eu vejo
É tudo para mim

"Sally Carter... Sally Carter..." suspirei e coloquei uma de suas mãos sobre o meu peito. "Sempre bateu forte assim por você. Sempre fui perdidamente apaixonado por você. Desde que meus olhos encontraram os seus pela primeira vez... Quando o seu rosto ainda carregava curativos coloridos." Sorri com a lembrança.
"Você se lembra disso?" me beijou.
Tirei a minha blusa. Ela começou a desabotoar a dela em meio a beijos.
"Rá! Vocês não podem se esconder pra sempre!" Ricardo gritou e abriu a porta do quarto onde estávamos.
Sally deu um grito se escondendo atrás de mim. "Sai daqui, retardado!"
Ricardo foi fechando a porta devagar enquanto se desculpava. "Ops. Bad. Desculpa aí, galera. Pensamos que iriam sair conosco. Foi mal mesmo..."
"MeuDeusquevergonha!" Sally ainda atrás de mim. "Por que você não trancou a porta?"
"Eu? Mas o quarto é seu..." respondi.
Ela saiu à disparada para trancar.
"Pelo menos foi o Ricardo. Nem sei por que fiquei tão envergonhada." Sally falava sem parar. "Talvez porque eu estivesse sem blusa agarrada a você num momento que deveria ser só nosso. Mas talvez eu"
Interrompi segurando o seu rosto, "Sally, amor, calma. Não foi nada demais."
Sally expirou. "Estou exagerando, né? Como sempre..."
Sorri.
Peguei minha blusa do chão e quando voltei meus olhos para a Sally... Completamente nua. Em segundos, como ela...
"Você não vai a lugar algum." Disse se aproximando de mim.


Miss you all the time underneath a stormy sky
You take away the rain and leave me with a sunny day
Stay here by your side and never let you go new
Sinto sua falta o tempo todo, debaixo de um céu tempestuoso
Você tira a chuva e me deixa com um dia ensolarado
Ficarei do seu lado e nunca te deixarei ir